Pivô do mensalão, Jefferson foi da base de ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), assim como o próprio Bolsonaro
Eduardo Militão
Brasília, DF
Atual presidente de honra do PTB, o ex-deputado federal Roberto Jefferson tem uma relação antiga com o presidente Jair Bolsonaro (PL), que mentiu ao tentar dissociar sua imagem da do aliado após a crise gerada ao resistir à prisão atirando em policias federais.
Pivô do mensalão, Jefferson foi da base de ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), assim como o próprio Bolsonaro, que era do mesmo partido. Jefferson foi líder do governo Fernando Collor (ex-PRN) nos anos 90. O ex-deputado acabou condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em 2012. Foi preso, solto e hoje está inelegível pela Lei da Ficha Limpa.
Pelo menos desde a época do mensalão, em 2005, Bolsonaro e Jefferson mantiveram uma relação política próxima. O hoje presidente disse que fez “grandes amigos” no PTB. E, durante o escândalo do mensalão, lamentou a cassação de Jefferson.
Nos últimos anos, a dupla se aproximou mais. Houve reuniões e declarações públicas de defesa um ao outro. Bolsonaro chegou a retransmitir uma conversa de Jefferson defendendo seu governo.
A reportagem separou episódios que mostram a proximidade entre os dois.
1 – Bolsonaro se filia ao PTB
2003 e 2004 – Depois de ser eleito para mais um mandato de deputado federal, Jair Bolsonaro troca o PP (à época PPB) pelo PTB de Roberto Jefferson. No período, emprega seu filho Eduardo Bolsonaro na Liderança do PTB com um cargo de natureza especial. Ele fica um “pouco mais de um ano” no PTB. Eduardo Bolsonaro fica no cargo até 2004, ano em que Bolsonaro deixa o PTB.
2- Fiz grandes amigos no PTB, disse Bolsonaro
17.mai.2005 – As denúncias de corrupção exibidas numa fita de vídeo com um diretor dos Correios, uma estatal controlada pelo PTB, rondam o Congresso. Na Câmara, o então deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) faz um discurso. Ele diz que fez “grandes amigos” quando estava no PTB de Roberto Jefferson.
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“Realmente me deixou saudades. Convivi muito bem com o partido até a antevéspera das eleições do ano passado.” Mas Bolsonaro afirma que Jefferson impôs uma condição eleitoral desfavorável a seu filho Carlos Bolsonaro nas eleições municipais de 2004.
Bolsonaro diz que assinará a CPI dos Correios porque Jefferson denunciou militares. “Mas não guardo mágoas do PTB. Quero apenas que a verdade seja esclarecida, tanto que assinei o requerimento de instalação da CPI e pretendo acompanhá-la, se possível, como seu integrante, até porque o deputado Roberto Jefferson citou o fato de um capitão-de-mar-e-guerra e um coronel terem ido a seu gabinete chantageá-lo, na tentativa de vender a fita veiculada pela mídia.” Leia o discurso.
6.jun.2005 – Jefferson denunciou à Folha de S.Paulo que o PT pagava dinheiro a deputados. É o mensalão. O próprio Jefferson seria condenado em 2012 por receber parte da verba do esquema.
3 – Bolsonaro lamenta cassação de Jefferson
15.set.2005 – Jefferson já era investigado pela Polícia Federal no esquema do mensalão. Ele teve o mandato cassado, mas foi defendido por Bolsonaro. “Roberto Jefferson pagou”, iniciou o então deputado federal.
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“Lamento. Não temos de discutir mais essa questão. Ficar batendo no ex-companheiro é lamentável”. Quando o suplente de Jefferson chegou, o colega lamentou de novo. “Preferia, tenho certeza, que Roberto Jefferson continuasse aqui. Mas as circunstâncias quiseram que assim fosse.”
4 – Jefferson nos salvou de outra ditadura, afirmou Bolsonaro
1º.out.2012 – O Supremo condena Roberto Jefferson no mensalão por lavagem de dinheiro. Ele já havia sido condenado por corrupção passiva.
10.out.2012 – Dez dias após a nova condenação de Jefferson, o então deputado Bolsonaro (PP-RJ) o homenageia em um discurso enquanto reclama da Comissão Nacional da Verdade, que investigou crimes cometidos durante a ditadura militar (1964-1985). Ao contrário, Bolsonaro diz que o regime “salvou” o Brasil no escândalo.
“Essa ‘Comissão da Patifaria’ só serve para enxovalhar as nossas Forças Armadas, que sempre estiveram do lado da democracia”, iniciou o então deputado.” E foi o que disse também a revista ‘Seleções’ de novembro de 1964, em encarte intitulado ‘A Nação que se salvou a si mesma’. Os militares salvaram o nosso país de uma ditadura em 64, e, em grande parte, credito a Roberto Jefferson o fato de termos sido salvos de outra ditadura, com a denúncia do mensalão”, continuou Bolsonaro.
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5- PTB apoia Bolsonaro em 2018
09.out.2018 – Comunicado do PTB, assinado por seu então presidente, Roberto Jefferson, anuncia apoio a Jair Bolsonaro no segundo turno das eleições de 2018. “As propostas de Bolsonaro visam um Brasil com mais empregos e melhoria de renda aos trabalhadores; com menos impostos e menos gastos públicos; e que respeite nossos municípios e nossas crianças, proporcionando a elas educação de verdade e com qualidade”, diz o texto. “Dentre outros, são projetos que objetivam um país eficiente e competitivo.”
6 – “Bolsonaro é meu amigo pessoal”
18.abr.2020 – Bolsonaro faz discurso em frente ao QG do Exército enquanto manifestantes gritam palavra de ordem contra o STF (Supremo Tribunal Federal) e o Congresso. A Procuradoria-Geral da República abre um inquérito contra organizadores e financiadores de atos antidemocráticos.
19.abr.2020 – Bolsonaro retransmite conversa do ex-deputado Roberto Jefferson com o ativista Osvaldo Eustáquio. O ex-deputado acusou o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia (então no DEM-RJ), de armar um “golpe parlamentar” contra o presidente da República.
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27.abr.2020 – Jefferson lembrou ao UOL que Bolsonaro foi seu liderado como membro do PTB no passado. “O Bolsonaro é o meu amigo pessoal. Guardamos isso do passado.”
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7 – Com fuzil, Jefferson apoia Bolsonaro
9.mai.2020 – Roberto Jefferson publica mensagem de apoio a Bolsonaro em rede social empunhando um fuzil. “Estou me preparando para combater o bom combate (…) Bolsonaro (…) precisa de duas atitudes inadiáveis: demitir e substituir os 11 ministros do STF, herança maldita.”
29.mai.2020 – Polícia Federal faz operação de busca e apreensão contra Jefferson para arrecadar armas exibidas por ele em rede social. No entanto, os agentes não encontram o armamento com ele.
8 – Jefferson convida Bolsonaro a voltar ao PTB
2.set.2020 – Aos sorrisos, Bolsonaro recebe Jefferson no Palácio do Planalto. “Roberto Jefferson reforçou o convite ao presidente Bolsonaro para que se filie ao PTB, com objetivo de disputar as eleições de 2022”, informou o perfil do PTB em uma rede social.
9 – Encontros entre os dois no Palácio do Planalto
13.abr.2021 – Bolsonaro se encontra com Jefferson no Palácio do Planalto, informou o PTB em rede social. Na ocasião, o partido disse que o presidente apoiava um político para concorrer ao governo do Rio Grande do Sul em 2022. O encontro não estava na agenda oficial.
“Nesta terça-feira, 13 de abril, o Presidente do Partido Trabalhista Brasileiro, Roberto Jefferson, participou de audiência com o Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro. O encontro foi realizado no Palácio do Planalto”, publicou o perfil oficial do PTB no Twitter.
29.abr.2021 – Bolsonaro e Jefferson se encontram no Palácio novamente junto com o pastor Paulo Xavier. A reunião não está na agenda.
19.mai.2021 – Bolsonaro se reúne com Jefferson e a braço-direito dele, a vice-presidente do PTB, Graciela Nienov. O encontro foi fora da agenda.
10 – Bolsonaro critica prisão de Jefferson
13.ago.2021 – Roberto Jefferson é preso por ordem do STF.
23.ago.2021 – Bolsonaro defende Jefferson após a prisão. “Foi preso há pouco tempo um deputado federal [Daniel Silveira] e continua preso até hoje, em prisão domiciliar. (…) Temos agora um presidente de partido [Roberto Jefferson]. A gente não pode aceitar passivamente isso, dizendo: ‘ah, não é comigo’. Vai bater na tua porta”, afirmou o presidente.
11 – Aquele abraço
11.jan.2022 – Em vídeo com Graciela Nienov, dirigente do PTB, Bolsonaro mandou um abraço a Jefferson, segundo o jornal “O Globo”. “Um abraço lá para o Roberto Jefferson”, disse o presidente. “Tenho uma longa história com Roberto Jefferson, já fui inclusive do PTB”, afirmou Bolsonaro.
27.jan.2021 – Jefferson faz discurso em favor de Bolsonaro e canta durante almoço em restaurante em Brasília.
12 – Sai Jefferson, entra Padre Kelmon
01.set.2022 – Jefferson tentou ser candidato a presidente mas foi barrado pela Lei da Ficha Limpa por ser condenado por corrupção e lavagem de dinheiro no mensalão. Em seu lugar, colocou Kelmon Souza, o Padre Kelmon (PTB), como candidato.
24.set.2022 – Sucessor do ficha-suja e aliado de Bolsonaro, Kelmon fez dobradinha com o candidato à reeleição em debate na TV Globo. Ele atuou para elogiar o governo bolsonarista.
13 – Com Bolsonaro no 2º turno
10.out.2022 – Roberto Jefferson e Padre Kelmon anunciam, no site do PTB, que defendem voto em Bolsonaro no segundo turno. “Nenhum cristão pode apoiar quem defende o aborto”, diz o comunicado
21.out.2022 – A primeira-dama, Michelle Bolsonaro, comemorou o aniversário de Kelmon Souza, o sucessor de Roberto Jefferson. Chamou-o de “o padre mais amado do Brasil!”. “Deus te abençoe, meu querido, viva o padre Kelmon”.
14 – Bolsonaro quis mandar ministro para negociar rendição de Jefferson
23.out.2022 – Jefferson joga granadas de efeito moral contra policiais federais que vão prendê-lo e os ataca com tiros de fuzil. No meio do conflito, Padre Kelmon aparece na residência.
Em meio à crise, Bolsonaro chama Jefferson de bandido e alega sequer ter fotos com ele. Porém, existem imagens. A afirmação é falsa.
O presidente também decide mandar o ministro da Justiça, Anderson Torres, à casa de Jefferson para negociar sua rendição, mas é convencido por aliados a não fazer isso.