Na Alemanha, golpistas em Brasília seriam considerados terroristas

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Se estivessem na Alemanha, os bolsonaristas que participaram da marcha de destruição nas sedes dos Três Poderes seriam indiciados como tal

Ivan Finotti
Madri, Espanha

Ainda que os ministros Flávio Dino (Justiça) e Alexandre de Moraes (Supremo Tribunal Federal) estejam usando em entrevistas e documentos os termos “terrorismo” e “terrorista”, os ataques a prédios públicos por bolsonaristas no último domingo (8) não são facilmente enquadrados na lei antiterrorismo brasileira.

A explicação é que a lei 13.260 prevê que serão considerados atos terroristas crimes com raízes em “xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião” –a motivação política não está na lista. Por isso, alguns especialistas preferem não chamar os golpistas de Brasília de terroristas.

Se estivessem na Alemanha, no entanto, os bolsonaristas que participaram da marcha de destruição nas sedes dos Três Poderes seriam indiciados como tal. Quem diz isso é o Escritório Federal para a Proteção da Constituição da Alemanha (BfV), o órgão de inteligência interna que desbaratou, no mês passado, o grupo Reichsbürger (Cidadãos do Reich) por planejar tomar o poder à força no país.

O BfV não comenta situações políticas de outros países, nem mesmo de forma hipotética, mas, questionado pela reportagem sobre seu conceito de terrorismo, a resposta não poderia ser mais clara.

“De acordo com a definição do BfV e dos serviços internos de inteligência, o terrorismo é a luta continuada por objetivos políticos que será executada por meio de ataques à vida, à integridade física e à propriedade de outras pessoas”, respondeu a instituição.
A definição alemã afirma ainda que ataques se enquadram como terrorismo se forem cometidos “especialmente por meio de crimes graves, como os mencionados na seção 129, parágrafo 1º, do Código Penal alemão”.

A seção citada se chama “Formação de Organizações Terroristas”. Entre as possibilidades de essas organizações cometerem outros delitos, como assassinatos ou sequestros, o texto estabelece que basta participar de grupos “com a intenção de destruir as estruturas políticas, constitucionais, econômicas ou sociais fundamentais do Estado” para receber uma pena de prisão que varia entre um e dez anos.


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Tem mais: somam-se mais cinco anos ou multa caso alguém “destrua ilegalmente, no todo ou em parte, um edifício, navio, ponte, barragem, uma estrada construída, uma ferrovia ou qualquer outro edifício pertencente a outro”. A mesma punição pode ser aplicada em caso de destruição de material de trabalho alheio, como computadores ou veículos.

É de notar que, para a Alemanha, duas vezes pior do que destruir prédios –fato que está sendo encarado por muitos como o crime principal dos bolsonaristas– é participar de um grupo que tem como objetivo a descredibilização das eleições e a subversão de seus resultados, o que no Brasil ocorreu em ampla escala antes, durante e depois do pleito vencido por Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O diretor do BfV, Thomas Haldenwang, fala do uso da bandeira alemã pelos extremistas em moldes parecidos com o que se vê no Brasil em relação à camiseta da seleção brasileira de futebol. “Nossos símbolos nacionais foram sequestrados pelos inimigos da democracia liberal, e isso me preocupa. Precisamos recuperá-los”, disse o alemão ao jornal The New York Times.

Haldenwang colocou um partido inteiro de extrema direita, o Alternativa para a Alemanha (AfD), sob vigilância. A decisão rendeu polêmica e muitas discussões no país. A sigla apelou, mas perdeu, e a vigilância segue em vigor.
“Uma das principais atribuições do BfV é o monitoramento dos esforços dirigidos contra a ordem de base democrática livre”, diz a instituição, referindo-se a um processo de várias etapas.


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“Informações confiáveis são necessárias para manter a República Federal da Alemanha protegida do terrorismo e do extremismo político e religioso. Os serviços de inteligência domésticos alemães obtêm a maior parte de suas informações de fontes abertas e de acesso geral, mas o uso de técnicas secretas também é indispensável para a coleta de informações.”

Quanto à polêmica sobre até onde podem ou devem ir os tentáculos do órgão recém-criado, o BfV afirma que mantém “padrões rígidos” na execução de seus trabalhos. “A supervisão do BfV é mais rigorosa do que a de quase qualquer outra autoridade pública.

Isso também é verdade para os serviços de inteligência domésticos dos estados federais. Existem vários níveis e mecanismos para garantir que os poderes não sejam mal utilizados e que as competências não sejam excedidas”.


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